
O pioneirismo como alicerce da jornada de Maggie
Há pessoas que fazem trabalhos repetitivos e são imensamente felizes. Mas eu era aquela criança que jamais aceitaria isso, sabe? O meu espírito não aceitaria isso. Por isso, a tecnologia, para mim, tem sido tudo de bom
Por Rafael Câmara
Margareth Ortiz de Camargo faz questão de destacar que pioneirismo é uma expressão recente. “Na minha época diríamos curiosidade. Ou persistência para conhecer coisas novas, para trabalhar em algo importante.” Feita essa observação, Maggie, como é conhecida a CIO da PUC Campinas, assume o título que lhe pertence: ela é mesmo uma pioneira na Tecnologia da Informação.
Aos 63 anos, Maggie carrega uma certeza de sua jornada: por demandar muito estudo e aprendizados constantes, a TI é para quem não se apega à rotina.“Se você quer estar na área, olhe para o seu perfil, olhe para dentro, e veja se você aguenta o tranco. É preciso manter os olhos abertos, ter uma visão holística do mundo e jamais ficar na zona de conforto”, aconselha.
E de fugir da zona de conforto Maggie entende bem. Essa é uma história que começou cedo, ainda na adolescência, quando ela passou no “vestibulinho” do Colégio Técnico da Unicamp, para cursar Processamento de Dados. Maggie foi da primeira turma do colégio. “A universidade estava um pouco despreparada para o curso, o que era natural. Então, no primeiro semestre, nós ficamos no campus da universidade, não onde seria o colégio mesmo. A gente teve essa experiência ímpar de participar do ambiente universitário. Imagine: com 14 anos e me sentindo universitária! Foi uma coisa maravilhosa”, lembra.
Se foi no colégio técnico que Maggie começou a dar passos na carreira, os voos mais altos ficaram para depois da realização de outro sonho, o de ser mãe. Ela se casou cedo e criou dois filhos enquanto trabalhava (e muito) como analista. Foi só depois, com as “crianças” já na adolescência, que Maggie investiu numa carreira como gestora.
Para ela, o caminho deu tão certo que vale a recomendação para mulheres que também sonham em ter filhos: “Eu tenho perfeita consciência de que hoje as mulheres estão fazendo isso tudo [família e filhos] depois, com 40 anos. Discordo completamente. Fiz com 20 e poucos anos e para mim foi a melhor fórmula do mundo. Eu acompanhava a molecada enquanto eles eram pequenos, dava carinho, afeto, atenção e, depois, numa fase de adolescência, eles não querem muito a mãe por perto, não. Aí, vale mais a qualidade que a quantidade”, conta.
A área da saúde é uma em que você trabalha e se sente, de fato, ajudando pessoas. Isso não tem preço
O desafio da gestão
Com os filhos criados, já graduada em matemática pela PUC Campinas e com carreira consolidada como analista, Maggie investiu nos estudos e nos cursos na área de Recursos Humanos para empreender sua jornada como gestora. “Não é só ser pioneira em tecnologia da informação. A gestão exige mais do que conhecimento técnico em tecnologia. Para ser uma gestora — e é aí que você faz mesmo a diferença —, é preciso trabalhar com pessoas, conhecer pessoas, fazer com que as pessoas cresçam nas suas áreas assim como você cresceu”.
Em uma de suas primeiras oportunidades como gestora, Maggie logo assumiu o cargo de gerente de sistemas do Hospital das Clínicas da USP, que conta com mais de dois mil leitos. Um desafio enorme, mas fundamental para que ela se sentisse confiante para escrever uma admirável história de 34 anos como gestora de tecnologia em grandes empresas hospitalares. “A área da saúde é uma em que você trabalha e se sente, de fato, ajudando pessoas. Isso não tem preço”, diz.
Além do Hospital das Clínicas da USP, Maggie também passou pelo Hospital das Clínicas da Unicamp e pela Secretaria de Saúde de São Paulo. Mas é a experiência ao longo dos dez anos no Hospital Sírio-Libanês, um dos mais importantes centros médicos da América Latina, que ela guarda com um carinho ainda mais especial. “No Sírio-Libanês, eu tinha recursos e essa minha veia de pioneirismo combinou com a deles, isso era um valor para eles”.
Como CIO do Sírio-Libanês, Maggie coordenou o desenvolvimento de um sistema web de informação próprio para o hospital e também o portal do paciente, onde todos os exames estão disponíveis. Também foi nessa época que o hospital ganhou seu portal do médico. Em 2014, o Sírio-Libanês já era apontado como um dos primeiros hospitais digitais do Brasil.
Os prêmios vieram na sequência do trabalho, e foram vários: três vezes na lista dos 100 + Inovadoras da IT Mídia: em 2008, 2014 e 2015; cinco presenças no Prêmio Profissional de Tecnologia de Informação pela Revista Informática Hoje; duas aparições como Executiva do ano pela ITMídia, em 2009 e 2013 — e isso só para citar alguns.
Há um conceito muito superficial do que é a tecnologia da informação. Ela é poderosa, pode fazer muita coisa, mas é altamente complexa e vem acompanhada de riscos.
Da saúde à educação
Depois de três décadas na área de saúde, Maggie voltou para Campinas, sua cidade natal, e encarou o desafio da educação. Foi assim que ela virou CIO da PUC Campinas, um cargo que antes costumava ser ocupado apenas por professores. Apesar dos 40 anos de experiência em tecnologia, nunca havia trabalhado numa empresa de educação. “Quando você trabalha com as pessoas com respeito, você faz trocas. Eu procurei aprender sobre o negócio educação com as pessoas que já estavam no grupo de TI da universidade. E eles aprenderam comigo a gestão, a metodologia… Foi um primeiro ano, em 2018, cheio de modificações, de imensa implementação de gestão e aprendizado do que é educação”.
Dentre os desafios daquele primeiro ano na nova área, Maggie destaca modificações nos processos da universidade, na gestão de projetos e até em nomes e cargos usados na instituição de ensino, mas que não existem mais no mercado. Se 2018 foi um ano de readaptação, pouco depois veio ela, a pandemia.
Como em todos os setores da sociedade, o impacto foi sentido. “As universidades que faziam educação à distância já tinham toda estrutura para o ensino remoto”, diz Maggie. Esse foi o caso da PUC Campinas, mas nem por isso o esforço de adaptação foi pequeno: professores e alunos precisaram ser educados em novas ferramentas num curto espaço de tempo e as licenças tiveram que ser revistas. “Valeu a pena”, comemora Maggie, garantindo que a universidade está em dia e pronta para o retorno das aulas presenciais e práticas.
Em sua jornada, Maggie testemunhou inúmeras mudanças na tecnologia da informação. Da época do colégio técnico, quando ela fazia os programas em cartão perfurado, à pandemia com a nova realidade imposta pelo coronavírus, as alterações foram sempre rápidas e, nas palavras dela, indescritíveis.
“A gente viu muitas mudanças aconteceram, mas as pessoas não acompanharam esse processo, principalmente os mais velhos. E, hoje, há um conceito muito superficial do que é a tecnologia da informação. Ela é poderosa, pode fazer muita coisa, mas é altamente complexa e vem acompanhada de riscos”, diz.
Apesar dos muitos desafios e da necessidade de estudos constantes, Maggie não tem dúvidas ao afirmar que trabalhar com TI foi uma das melhores decisões de sua vida. “Há muitas maneiras da gente ser feliz, mas é preciso trabalhar com o que você gosta. Há pessoas que fazem trabalhos repetitivos e são imensamente felizes. Mas eu era aquela criança que jamais aceitaria isso, sabe? O meu espírito não aceitaria isso. Por isso, a tecnologia, para mim, tem sido tudo de bom”.
Se a fala anterior soa como um testemunho pessoal, basta olhar para a carreira dela para ficar claro: não é só a TI que foi fundamental para a vida da Maggie. A Maggie também é fundamental para a TI.
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