A rápida ascensão das fintechs forçou os grandes bancos a buscarem soluções mais avançadas. Nessa busca frenética por ser mais tecnológico, é preciso separar o que é “fogo de palha” daquilo que vai efetivamente moldar o mercado financeiro nos próximos anos

Historicamente, o setor financeiro tem a característica de early adopter, ou seja, de se antecipar às inovações tecnológicas. Por isso, não surpreende que o setor de fintechs tenha crescido muito nos últimos anos, forçando os bancos tradicionais a adotarem modelos digitais mais eficientes. Diante do crescimento rápido, é necessário perguntar: quem determina as mudanças são as transformações do negócio ou a própria evolução da TI?

“As ferramentas tecnológicas impulsionam as transformações do mercado financeiro”, responde Aloísio Corrêa, diretor-superintendente na Galgo Sistemas de Informações S.A. Para o executivo, as transformações que este mercado experimentou nos últimos 30 anos foram decorrentes da evolução das ferramentas tecnológicas, do barateamento das mesmas, do surgimento do smartphone e da popularização do acesso à Internet.

 

“Se hoje já é possível acessar o banco ou a fintech via celular, tablet ou notebook, com a IoT você poderá fazê-lo utilizando dispositivos até então inimagináveis”, Aloísio Corrêa, da Galgo Sistemas

Porém, há quem acredite que o setor tem também seu mérito. “O Brasil, dado o contexto histórico da alta inflação, obrigou o sistema financeiro e as partes conectadas a ele a investirem pesadamente em tecnologia nos últimos 20, 30 anos. Temos um Banco Central altamente inovador, lançando soluções de pagamento como o PIX, ou de abertura de informações, como o open finance, entre outras, avalia Piero Contezini, CEO e fundador do Asaas, uma startup que atua como conta digital para empreendedores.

Contezini lembra que a maior parte dos bancos no Brasil têm seu aplicativo para todas as plataformas, tendo a maior parte das funcionalidades acessíveis de forma completamente digital. E que as fintechs vieram para “gerar competitividade contra os incumbentes, diminuindo drasticamente o custo de acesso aos serviços, sejam de conta corrente ou até mesmo de crédito, impactando principalmente a inclusão financeira”.

E o cliente, vai bem?

Tanta tecnologia e novidade devem criar um ambiente excelente para a jornada do cliente, certo? Bem… Quase isso. É óbvio que a adoção da tecnologia pelos bancos sempre teve como objetivo uma melhor jornada do cliente, desde os caixas eletrônicos aos aplicativos de smartphone e atendimentos por videochamada, sem falar nas soluções de segurança. 

Os competidores do setor financeiro também trazem uma nova experiência ao consumidor. Os marketplaces de crédito e seguros, por exemplo, bem como as corretoras de investimento, são serviços que competem com os bancos em alguns serviços e forçam as tais corporações a tornar a interface com o cliente mais simples, agradável e personalizada. Contudo, é importante ressaltar que há ainda muito a melhorar em relação a experiência do usuário.

“Abordagens avançadas de análise ajudam a aproveitar o verdadeiro valor dos dados para muitos casos de uso, mas nem todos estão aptos a utilizá-los da melhor forma possível porque ainda temos uma carência de cientistas de dados no mercado brasileiro”, Carolina Rezemini, da Credolab

Lentidões, interfaces confusas, mensagens de erros ainda são muito comuns em várias aplicações bancárias. Isso frustra o cliente e gera uma enxurrada de chamados de atendimento. Os testes no setor bancário sempre foram encarados com seriedade em relação à segurança, o que sem dúvida é importantíssimo, mas insuficiente. Para avançar na melhoria da experiência do cliente, é necessário agregar novas camadas de testes que verifiquem usabilidade, performance e funcionalidade”, conta Everton Arantes, CEO da Prime Control, empresa de QA e testes de software que tem, entre seus clientes, algumas instituições financeiras.

Carolina Rezemini, diretora regional de Vendas para a América Latina da Credolab (empresa dedicada à análise de dados no desenvolvimento de scores de crédito), acredita que antes havia uma separação entre bancos e demais empresas, mas que, hoje em dia, não é mais válida.  

Os serviços financeiros começaram com transações bancárias e produtos de crédito puros, mas hoje isso se mistura ao consumo de varejo, por exemplo.Nesse aspecto, a jornada do cliente é vista de forma mais ampla.  Os marketplaces proporcionam a seus clientes acesso a serviços financeiros como seguros, empréstimos e crediários digitais de forma simples”, diz Carolina. “Da mesma forma, aplicativos bancários se apresentam como hubs de serviços diversos, permitindo mais escolhas e facilidades e empoderando o consumidor. Não se pode mais pensar no produto de forma isolada”. 

Dessa forma, a executiva prevê que as oportunidades continuarão a evoluir a partir do melhor entendimento do cliente e seu comportamento, o que permite desenhar soluções cada vez mais customizadas e flexíveis para contemplar uma jornada orientada pelo usuário. 

“O Brasil, dado o contexto histórico da alta inflação, obrigou o sistema financeiro e as partes conectadas a ele a investirem pesadamente em tecnologia nos últimos 20, 30 anos”, Piero Contezini, do Asaas

Soluções à vista

E quais as ferramentas que devem ganhar corpo para avançar nesses novos modelos de negócios? A boa notícia é que são muitas, a começar pela “Internet das Coisas”.

“Entendo que podemos esperar uma disrupção ainda maior com a expansão da IoT. Se hoje já é possível acessar o banco ou a fintech via celular, tablet ou notebook, com a IoT você poderá fazê-lo utilizando dispositivos até então inimagináveis.  A essência das operações não muda: fazer um pagamento, uma transferência, acessar o saldo, obter um empréstimo, etc. O que se transformará é a forma de fazê-las, diz Aloísio Corrêa, da Galgo.

A jornada de dados também ocupa papel de destaque. Porém, Carolina Rezemini acha perigoso o discurso de que quanto mais dados, melhor. “Falando sobre os fornecedores de dados ou empresas que geram leads, criam modelos ou segmentam perfis, temos que destacar quanto o cuidado com esses dados é importante”, ressalta a executiva.

“Um exemplo simples é que há muita empresa que começou a coletar todo tipo de dado para depois pensar como usar e ainda não fez uso nem sabe como lidar com a quantidade de informação a que tem acesso. À luz da LGPD, esse tipo de coleta indiscriminada não é permitida e expõe uma falta de planejamento e cuidado”, continua.

“A robotização vem sendo aplicada para integrar sistemas legados com novos sistemas. É bastante empregada também na verificação de regulações e no monitoramento de atividades suspeitas”, Everton Arantes

Ela prossegue: “Dados anonimizados e insights — sejam granulares ou agregados — estão ganhando terreno. Abordagens avançadas de análise ajudam a aproveitar o verdadeiro valor dos dados para muitos casos de uso, mas nem todos estão aptos a utilizá-los da melhor forma possível porque ainda temos uma carência de cientistas de dados no mercado brasileiro”.

Por fim, há a robotização, uma grande aliada do setor financeiro. Em alguns casos, robôs estão sendo usados para facilitar a digitalização de documentos, o tratamento e a validação de dados em processos como abertura de contas e crédito. Certamente, todos conhecem os robôs do atendimento digital. Mas Everton Arantes fala de muitas outras aplicações possíveis.

“A robotização vem sendo aplicada para integrar sistemas legados com novos sistemas. É bastante empregada também na verificação de regulações e no monitoramento de atividades suspeitas. Nas atividades de mercado, robôs são usados para monitoramento de sentimento em mídias sociais, detectando insatisfações crescentes que possam significar um problema emergente. A automação também ajuda na detecção de vazamento de dados e na adequação às regulamentações LGPD, GDPR e CCDA”, lista o CEO da Prime Control. 

 

Leia mais:

2021: uma perspectiva realista e imediata sobre a aquisição de produtos e serviços de TI

Ampliação de portfólio X especialização: é possível obter o melhor dos dois mundos?