Já se foi o tempo em que pouca gente comprava roupas online. Hoje, diversas tecnologias e ferramentas permitem que o cliente tenha certeza de que está adquirindo o produto certo, e sem a necessidade de visitar o provador de uma loja física. 

Saem os provadores, entram as informações detalhadas sobre cada peça: o varejo de moda também se digitalizou. É cada vez mais comum comprar camisas, vestidos, sapatos e bolsas sem sair de casa e, claro, muitas vezes, sem nem tocar na peça. “Quem tem só loja física de moda precisa urgentemente ir pro digital ou, então, estará morto”, alerta Juam Rosa, CEO da Complement Consultoria & Marketing. 

Um levantamento da Associação Brasileira de Comércio Eletrônico (ABComm) que englobou apenas o primeiro ano da pandemia já demonstrou isso. Segundo a pesquisa, o crescimento nas vendas online em 2020 foi de 68%, na comparação com 2019. E o segmento de moda foi um dos que mais vendeu no ano passado. Segundo uma pesquisa da Conversion, realizada em abril de 2021, o setor registrou 1,51 bilhão de acessos no e-commerce em um ano, número que representa um crescimento de  52%. A mudança é clara e exige mudanças de pequenos, médios e grandes lojistas.

Ao citar casos de comerciantes que durante a pandemia viram o faturamento cair oito vezes e que ainda operam num patamar próximo ao de 2016, Rosa chama a atenção para a necessidade de mudança na operação das lojas físicas. “Se não se moverem um pouco mais rápido, vão ficar para trás. O lojista que tem essa crença de que não pode ir para o digital porque o cliente não vai conseguir provar está sendo totalmente irreal. Hoje há condições de trocar uma peça, no digital mesmo, com facilidade. E os principais players do varejo de moda digital estão ganhando muito dinheiro”, completa ele. 

A tecnologia impulsiona a proximidade e a transparência; dessa forma, ajuda a quebrar possíveis resistências em relação à compra online e a escalar esse modelo de negócio

Victória Alonso, cofundadora da OZLLO, marketplace de moda que estimula o consumo consciente e que reúne produtos seminovos de grandes marcas internacionais, chama a atenção para algumas necessidades da venda online. “Quais informações precisam estar disponíveis? Que tipo de foto é interessante incluir? Quais medidas? É preciso entregar todos os dados que o cliente de fato busca quando ele consome no modo online”. 

No caso da OZLLO, Victória diz que essas respostas vieram naturalmente. “Se souber fazer da forma que seja um sucesso, de forma que funcione, não poder provar a peça deixa de ser uma questão. A dica é se associar a players que saibam transmitir essa experiência do offline para o online”, completa. 

A transparência é outro ponto importante: o cliente precisa saber quais as regras e o procedimento de troca ou devolução, além de poder tirar qualquer dúvida que tenha sobre o produto, em tempo real. “A tecnologia impulsiona a proximidade e a transparência; dessa forma, ajuda a quebrar possíveis resistências em relação à compra online e a escalar esse modelo de negócio”. 

Outro ponto importante é a jornada de compra: a aquisição pode não ser efetivada online, mas há grandes chances de que seja iniciada com uma pesquisa na internet e finalizada com a ida do cliente até a loja física. “A tendência é a omnicanalidade. Deve-se olhar para o setor de moda como uma experiência que vai além do físico ou do digital, na realidade, ele deve integrar os dois universos”, completa Victória Alonso. 

As tecnologias que vestem as vendas digitais do varejo de moda
“É uma barreira genuína, mas que está sendo notoriamente vencida. As tecnologias no mundo da moda estão testando as possibilidades da realidade virtual e imersiva para o consumidor entender como a roupa ficará ao usá-la”,  Arthur Igreja, especialista em tecnologia, inovação e tendências.

O varejo de moda em outros países

Observar a situação do varejo de moda em outros países ajuda a entender o que podemos esperar para o Brasil. De soluções simples, como uma maior facilidade de devolver peças que não serviram e a isenção de taxa para fazer isso, até a adoção de novas tecnologias. “Nos Estados Unidos, podemos mencionar o exemplo do wardrobe, da Amazon, onde o consumidor recebe uma caixa com vários produtos e escolhe com qual quer ficar ou até mesmo se prefere devolver tudo”, explica Arthur Igreja, especialista em tecnologia, inovação e tendências e autor do livro Conveniência é o Nome do Negócio. Ele também cita o surgimento dos modelos 3D e da realidade aumentada como avanços tecnológicos do setor para superar o problema de não ter os provadores de uma loja física por perto. 

“É uma barreira genuína, mas que está sendo notoriamente vencida. As tecnologias no mundo da moda estão testando as possibilidades da realidade virtual e imersiva para o consumidor entender como a roupa ficará ao usá-la. E existem algumas tecnologias mais de vanguarda, do tipo escanear a pessoa. Em algumas cidades americanas é possível fazer esse modelo em 3D do consumidor e passar a usá-lo para testar as roupas que quer comprar”, aponta Igreja. 

Para o especialista, é preciso que o setor não abandone os desenvolvimentos tecnológicos dos últimos dois anos, que foram forçados pela pandemia. “Quem simplesmente respirar fundo e afirmar que passou estará jogando fora uma chance incrível. Fica esse aprendizado de que, sim, as pessoas mudam comportamentos e hábitos, e também que a tecnologia está amplamente disponível. E se as pessoas conseguem se adaptar em épocas de exceção, elas deveriam ser capazes de ter a mesma capacidade para se adaptar em períodos mais tranquilos”, argumenta.

As tecnologias que vestem as vendas digitais do varejo de moda
“A tecnologia não para, as empresas também não. Então você nunca chegou lá, você sempre tem que estar preparado para outra coisa”, Willian Valiante, da Capgemini.

 

O que esperar do futuro?

Especialistas e lojistas apontam que muitas mudanças devem ocorrer no setor de moda nos próximos anos. A chegada de novas tecnologias, como as que já estão sendo testadas em outros países, será uma das causas.

“A grande tendência é a integração de tudo. Não gosto de visões muito binárias, como o avanço do digital acabando com as lojas físicas. Isso não acontecerá. Integração tecnológica e de conceitos, uso de dados para propor sugestões de roupas, tecidos e caimentos: esse é o futuro. É interessante ver que o varejo caminha para ser mais ativo, baseado em dados e, consequentemente, ainda mais próximo das pessoas”, conclui Arthur Igreja.

Enquanto isso, gigantes do setor investem na integração entre lojas físicas e digitais, apostando na omnicanalidade. Um exemplo é a Riachuelo, uma das maiores varejistas do Brasil, com 330 lojas. No ano passado, a empresa anunciou um grande investimento na transformação digital. O objetivo é ter uma cadeia totalmente integrada até 2024. 

Para Willian Valiante, vice-presidente de produtos de consumo, varejo e distribuição da América do Sul na Capgemini — empresa que trabalha nas transformações da Riachuelo —, a tendência para o futuro é mesmo híbrida. “A gente está vendo lojas cada vez mais modernas e conectadas, com a finalidade de proporcionar, aos clientes, experiências digitais. Ao mesmo tempo, vemos operações digitais tentando proporcionar uma experiência parecida com a da loja física, lançando mão, por exemplo, de provadores virtuais. Ou seja, a questão a ser respondida é: quais são as boas experiências dos dois mundos? O que as pessoas gostam no digital e o que elas gostam nas lojas?”. O executivo acrescenta que o objetivo é o cliente sentir que, seja na loja física ou digital, ele é reconhecido e tratado da maneira mais personalizada possível, o que confere mais fluidez à jornada de compra, ao diminuir “as fricções”.  

Valiante aponta ainda para o que ele chama de ponto de atenção e oportunidade: o dos clientes que fizeram compras online pela primeira vez na pandemia, depois de alguma relutância, e que, agora, voltam às lojas físicas. É preciso entender como esses consumidores irão se comportar e quais novas demandas eles farão. “A tecnologia não para, as empresas também não. Então você nunca chegou lá, você sempre tem que estar preparado para outra coisa”, conclui Valiante. 

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